Volume 1

Capítulo 18 – Amação, parte 4

Atualizado em: 28 de outubro de 2022 as 12:50

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Hum hum, que tédio. A manhã foi especialmente lenta, com apenas alguns mercantes entrando e saindo de olhares pesarosos pela presença dos jaquetas do lado de fora, ou mesmo os mensageiros dos grandes comerciantes e donos de fábricas, que até estavam mais tranquilos com a segurança de estarem atrás de um grande nome da cidade, mas ainda assim pareciam nervosos na presença dos animais selvagens da trupe dos leopardos, já que eles sabiam bem a merda que eles costumavam fazer.

Suspirando, o homem no balcão voltou a ler seu jornal local, nada além de notícias entediantes e bem articuladas para não chamarem atenção do reitor, muito esperto da parte deles.

O balconista coçou seus bigodes escuros e longos com seu olhar morto voltado para os parágrafos, ajeitou o colarinho preto por cima da gola da camisa branca, sob um colete carmesim, e alisou os cabelos escuros penteados para trás em seu rosto aquilino, em cima da mesa do balcão não havia nada além de alguns papeis, carimbos, e documentos padrão para fazer pedidos, o espaço do hall onde os inúmeros pedidos de envio de cartas e receber pacotes estava o mesmo de sempre, o chão coberto pelo carpete castanho de padrões losangulares, plantas enfeitando os cantos das paredes e algumas poltronas acolchoadas vermelhas para que os pedidos mais longos pudessem esperar antes de subir as escadas para a ala acima. Mas agora, estava tudo vazio e silencioso, a não ser pelos dois jaquetas parados encostados ao lado da entrada e os dois soldados da guarda da cidade parados nos flancos do balcão.

Era uma visão rara ultimamente os ver trabalhando ativamente, normalmente o reitor os mantinha distantes da cidade, mas como aparentemente as coisas estavam muito estranhas por ali, era compreensível.

Mas ainda assim, ver o lugar quase vazio era bizarro. A alfandega era o centro de comunicação e transporte de cartas da cidade, para-la sequer por um dia poderia prejudicar brutalmente os grandões do comercio e produção da cidade, que merda o reitor achava que estava fazendo? Suspirando, ele virou a página de seu jornal sem graça que lia todos os dias de sua vida. Pelo menos, um pouco de folga não era um problema, e com felicidade seguiu lendo aquele artigo artificial sobre o crescimento de vendas de galos negros ao sul da zona áurea.

Bham!

Surpreendendo tanto ele quanto os jaquetas e soldados guardando o local, seus olhares tensos se voltaram na direção da porta de carvalho na entrada, seus dedos pressionaram com mais força suas armas enquanto fixavam seus olhares no movimento casual e suave que ela fazia. O ranger da madeira e das trincas sendo forçadas preencheu todo o ambiente cheio dum silêncio mórbido, e a luz de fora entrou na recepção iluminada por uma cálida luz de lamparinas no teto de madeira, com curiosidade, o recepcionista observou a cena dos jaquetas se aproximando da porta cautelosamente, até parecia que era um demônio quem estava para entrar, mas para sua surpresa, e da dos guardas e jaquetas, foi outro jaqueta quem havia entrado.

Arfante, de olhos injetados e um tacape na mão, ainda segurando a maçaneta da porta, ele inspirou o máximo de ar que pôde antes de exclamar com a energia que lhe sobrou.

- Ele está aqui! O espadachim está aqui! Está tentando sair da cidade! Venham me ajudar!

- Que porra... – comentou um dos jaquetas em guarda, encarando de frente o jaqueta na porta, que intensificou a sua expressão ainda mais.

- Merda! Andem logo! Ele está nos massacrando aqui! Estamos quase cercando ele! Vamos chamar o senhor Nishe e acabar com isso logo! Então venham ajudar!

- Merda! Vocês se resolvam aqui! – por fim exclama o jaqueta, cedendo àquela pressão externa e repentina, acenando para seu companheiro, que o seguiu para fora da sala.

Clang

A porta se fecha, e os soldados guardando de perto o balcão fungam em desgosto. Dez anos de treino e esforços imensos na escola de Krista apenas para ter de engolir marginais que acham ter alguma moral por cima dos orgulhosos soldados da guarda. Era degradante, uma ofensa a sua moral, ainda que usassem a mão firme do reitor como uma desculpa para não tomar iniciativa entre si.

E o recepcionista concordava em muito com eles, deixando o olhar de lado que direcionou a porta cair no jornal mais uma vez. Mesmo tendo ouvido que um dos perigosos criminosos estava à beira daquelas portas querendo escapar da cidade pela estrada há alguns quarteirões dali, estava confiante de que a eficácia da trupe em exterminar pessoas venceria no final, afinal, ninguém consegue vencer realmente um bando de leopardos furiosos, certo?

Bem, talvez sua perspectiva tenha mudado quando outro estalar se ouviu e a porta voltou a abrir. Os guardas a encararam atentos pela lentidão em que ela se abria, e não foi um jaqueta quem estava entrando. Antecedido por sua pequena sombra, a luz de fora preencheu o início da recepção, e quem ficou entre a visão da calçada e a luz fora um garoto.

O recepcionista franziu o cenho de estranheza, como o garoto havia chegado ali? Não estava uma confusão lá fora? Mas logo, as roupas exóticas do garoto lhe deram alguma pista do que poderia estar acontecendo, assim como para os guardas, que pressionaram o aperto nas baionetas enquanto viam o garoto fechar a porta atrás de si com um sorriso confiante e se aproximar do balcão.

O roupão vermelho de estampas de folhas brancas com a faixa de tecido amarelado em sua cintura era algo diferente e parecia fina, do tipo que não se consegue em qualquer lugar, algo típico de riquinhos que gostavam de exibir seu status usando coisas que não se veem muito por aí, e a capa seca com um capuz que cobria sua cabeça era um contraste estranho. Seu sorriso relaxado acompanhado de olhos vibrando de confiança deixava ainda mais claro que ele tinha intenções certeiras ali, o que fazia com que sua chegada não fosse mais tão estranhada pelos presentes.

Os guardas olharam entre si afrouxando o aperto, ainda optando pela melhor ação enquanto observavam atentamente a figura parar alguns passos na frente do balcão, que cobria quase toda a sua altura, lhe deixando apenas dos ombros acima para observar o homem a frente.

O recepcionista largou o jornal no balcão com um olhar desinteressado e voltou a atenção forçadamente para o garoto, que provavelmente chegava em nome de algum figurão da cidade querendo de qualquer jeito mandar suas cartas mesmo que custasse a vida de seu empregado de alto nível em aprendizagem, o que não era necessariamente uma escolha ruim.

- Bom dia, o que o senhor deseja? – o recepcionista roboticamente cumprimenta.

- Enviar uma carta, é claro, senhor, não é pra isso que serve o estabelecimento? – respondeu o garoto, deixando claro que não se deixaria ficar por baixo do recepcionista, realmente um garoto perspicaz.

- Claro, claro, me desculpe, - o homem seguiu, com desdém, recusar o pedido ou aceitar era uma opção totalmente sua naquele tipo de situação, os guardas sabiam, e apenas observaram de esguelha a situação esperando pelos sinais do recepcionista, que até o momento parecia pelo menos querer ouvir o que o garoto tinha a dizer. Então o recepcionista abriu seu sorriso mais falso fechando seus olhos enrugados. – Em nome de quem o senhorzinho veio fazer o pedido?

- Meu caro, poderíamos deixar estas formalidades de lado? Meu caso tem um pouco de urgência nele. – O garoto seguiu, encarando o olhar de peso do recepcionista.

Em sua vez, o homem abriu lentamente o olhar com desdém, admirando a atitude alerdada do garoto, a menos que tivesse vindo em nome do próprio reitor, não fazia o menor sentido estar pedindo por algo tão absurdo até mesmo para os donos de fábricas da cidade.

- Senhorzinho, acho que não está entendendo, preciso do nome de seu empregador, de uma carta com a assinatura e carimbo dele e de um brasão que mostre que tem a permissão dele para agir em seu nome, assim poderei fazer o seu pedido e registrá-lo, entende?

Como explicando a um recém-nascido, ele se inclinou no balcão, aproximando levemente o rosto do garoto, que para sua surpresa, encarou bem e devolveu o olhar. E mais surpreendente ainda, o pequeno chegou mais perto do balcão e recostou o braço desleixadamente nele, olhando de perto o recepcionista.

- Acho que o senhor não entendeu ainda, o meu caso é realmente sério. Preciso entregar esta carta a seu destino ou cabeças vão rolar do meu lado. Não é nada grande o suficiente para machucar alguém ou escrito para prejudicar, é só uma carta com um aviso importante, entendeu? Estou até mesmo disposto a te pagar um extra... – seguiu Fyrr, retirando da manga do braço estendido um pequeno saco de pano preso por um botão. Ele deslizou lentamente da mesa até o torso do recepcionista. – Se for necessário. Meu chefe é tão bondoso que não se importa se pode perder dois, três, ou sequer cinco mil cruzeiros...

- Hmmmmm

Olhando de esguelha para o pano, o homem trocou de olhar do saco para o garoto transbordando em soberba, para então aproximar seus dedos no botão e puxá-lo, abrindo o saco e vendo-o estar cheio de moedas de ouro de cem cruzeiros.

Por um segundo seus olhos brilharam e abaixaram de tom. Pelo visto, não parecia ser nada de real perigo, mesmo assim, ficar de olho no garoto e registrar a entrega seria bastante necessário, necessário para seu bolso.

- Entendo, senhor, não gostaria de lhe causar mais problemas, então poderemos prosseguir? – diz o recepcionista, com um belo sorriso sincero no rosto.

- Que bom que entendeu, obrigado, senhor recepcionista.

- Estou aqui para servi-los, como um bom funcionário público, meu bom jovem. – Gabou-se ele, colocando o saco no nicho abaixo dentro do balcão, onde guardava pequenos objetos metálicos, então mudando para uma posição mais ereta, ele encarou o garoto com um sorriso esperto. – Pela gravidade da situação, devo esperar que está em busca de um serviço expresso, certo?

- Isso mesmo, meu bom homem.

- Certo...

O homem mandou um olhar calmo e controlado para os guardas, rápido e brilhante como foi, os soldados apenas confirmaram suas suspeitas e se voltaram a encarar a porta, protegendo o balcão de um inimigo invisível e estranhando a falta de barulho que estava lá fora, sabendo que não havia nada com o que se preocupar com o garoto.

- Por favor, siga-me!

Com aquele sorriso falso de servidor, o recepcionista caminhou pelo curto espaço entre o balcão e a parede atrás de si em direção a porta depois dela, uma porta de carvalho alta, que o homem abriu com leveza, ficando de lado para deixar o garoto entrar primeiro, Fyrr passou com serenidade por ele e atravessou a entrada mais escura do interior misterioso da alfandega, e o homem o seguiu fechando a porta atrás de si com um estalo seco, tomando a frente em seguida.

Ambos com sorrisos confiantes, seguiram juntos pela sala grande e cheia, que era o depósito pré-envio.

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