Volume 2

Capítulo 0058: O fim da jornada

Atualizado em: 19 de dezembro de 2023 as 20:33

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Siegfried tinha acabado de levar dois cadáveres para longe do acampamento, quando encontrou a terceira rebelde ainda viva; sua voz tinha morrido, as lágrimas congelaram no rosto e mal conseguia se mexer, mas quando o viu, tentou puxar uma adaga do cinto com seus dedos moles.

O rapaz tirou a lâmina dela, abriu sua garganta e então levou o corpo para junto dos outros.

Quando voltou, Dara ainda cuspia no chão, mas já não tinha mais nada no estômago para vomitar. A garota não disse uma palavra desde que salvou sua vida, mas de vez em quando o olhava com receio, quando achava que ele não estava prestando atenção.

— É melhor dormir um pouco. Partimos ao amanhecer.

Não esperava uma resposta e, por um momento, não pareceu que receberia uma, mas Dara fez o seu melhor; forçou um sorriso e até o olhou nos olhos ao agradecer:

— O-obrigada…

— Hum?

— Por me salvar. Devia ter dito antes.

— Ah… Tá legal.

— Eu te daria um beijo, mas acho que preciso lavar a boca primeiro.

Dessa vez o sorriso dela foi mais genuíno e até Siegfried deixou escapar um quando disse:

— Cê não tem que ficar com medo de mim, sabe disso, né?

— Eu não fiquei! Q-quero dizer, um pouco. Mas não do jeito que cê tá pensando. É só que, e-eu vi… Quando matou ele, tinha alguma coisa no seu olhar. Não sei como explicar, só fiquei um pouco… Surpresa. Nunca tinha te visto daquele jeito antes. Foi como–

— Um animal?

— N-não! Quero dizer, não foi o que eu quis dizer. Eu só… D-desculpa.

— Não tem nada pra desculpar.

— …

— Vai amanhecer logo, é melhor descansar um pouco.

Não houve fogueira naquela noite. Se houvessem mais rebeldes na região, Siegfried não iria facilitar o trabalho deles, por isso escolheu um lugar mais ou menos quente, próximo das árvores, onde as rajadas de vento não os alcançava, e dormiram aconchegados um no outro.

Como prometido, partiram ao amanhecer.

Siegfried deu à Dara o melhor cavalo dos rebeldes mortos, um jovem palafrém branco de pernas fortes, e cortou a garganta dos outros três.

— Por que fez isso? — perguntou ela, chocada.

— Não posso soltá-los, se voltarem pra casa, Eradan vai saber que tem algo errado e enviar mais homens atrás de nós.

— A gente podia levar eles! — disse, como uma criança determinada tentando convencer os pais a lhe deixarem ficar com um gatinho que achou na rua.

— Não temos tempo. Levar três cavalos nessa floresta já é difícil normalmente, se uma nevasca começar…

— Então deixava eles aqui!

— Amarrados? Acho que uma garganta cortada é mais piedoso do que deixá-los morrer de fome.

— M-mesmo assim…

Depois disso, a garota parecia ter ficado um tanto quanto protetora com a própria montaria, como se o rapaz pudesse cortar a garganta dela também a qualquer momento.

Já era de tarde quando pararam perto do rio congelado para comer alguma coisa e descansar; foi onde Dorian, que ainda insistia em usar sua armadura, os encontrou.

— Dara! — gritou, cavalgando para mais perto da sua irmã. — Te achei.

— Dorian? — A garota se encolheu, confusa. — O que tá fazendo aqui?

— Eu vim te salvar, é claro.

Só então o garoto pareceu notar Siegfried parado ao lado dela e fez uma cara de nojo, como se tivessem jogado merda no seu cabelo, então voltou a ignorá-lo.

— Vamos — disse, estendendo a mão para ajudá-la a montar com ele. — Vou te levar pra casa.

— …

— Dara!

— Eu posso cavalgar sozinha! Tenho um cavalo, viu?

— Aquela coisa feia?

— O nome dele é Nevado!

— E desde quando você sabe cavalgar, garota idiota!? Vai acabar caindo e quebrando a droga do pescoço, isso sim.

— Isso é problema meu!

— Cê tá de sacanagem!? Eu vim até aqui por você, sua ingrata! — Então virou o rosto para Siegfried, com a cicatriz em seu olho esquerdo tão vermelha que quase parecia sangrar. — E você ainda prefere esse mercenário!?

— Ele me salvou! O que já é mais do que você fez. Não sei porque veio aqui, mas não teve nada a ver com me ajudar, disso tenho certeza.

— Vadia…

— …

— Puta! Aproveite o seu mercenário o quanto quiser, é o melhor que cê vai arrumar mesmo. Mas não venha correndo atrás de mim quando ele te vender pra um bordel qualquer, que nem fez com aquela sua amiguinha inútil.

Então se virou e foi embora.

Só então Siegfried notou que estava com a mão no cabo da espada.

Na manhã seguinte, passaram por Dorian novamente, ainda lutando com a sua montaria cansada. Quando os viu cavalgando lado a lado, observou em silêncio, mas tão logo o deixaram para trás, ouviram os gritos:

— Se mexe, sua maldita mula preguiçosa! Anda! Eu vou transformar você em carne seca quando voltarmos!

Por algum motivo, isso deixou Dara aos risinhos e a viagem de volta foi bem mais tranquila, mesmo quando a nevasca recomeçou.

Chegaram no vilarejo ao anoitecer do terceiro dia de cavalgada, quando a neve tinha piorado e todas as portas estavam fechadas, mas Siegfried se deteve por um momento para observar a sua recepção de boas-vindas; nove cadáveres recém enforcados.

Cinco mulheres, com idades entre quinze e vinte anos, e quatro homens, o mais novo com doze e o mais velho, dezoito. Seus rostos estavam roxos e inchados, mas ainda os reconhecia.

— Os rebeldes…

Nunca descobriu o nome de nenhum deles, mas gastou algum tempo olhando para a morena de dezoito anos com sardas no rosto. Lutava bem e era corajosa, teria dado uma excelente soldado.

“E também lutou antes de morrer”, percebeu.

Ainda podia ver onde quebraram o braço dela e tinha certeza de que encontraria ainda mais hematomas se tirasse suas roupas esfarrapadas, mas uma crosta de gelo já se formava ao redor dos cadáveres como um agasalho, por isso era difícil dizer quão machucados deviam estar antes de morrer.

E ficava pior.

Mataram também o mensageiro.

“Que merda a Elly tá fazendo!?”

Era um idiota, com certeza, e um rebelde, mas nunca se mata o mensageiro. Agora não haveria mais como negociar com Eradan; ele jamais iria enviar outro emissário, e se o conde o fizesse, enforcariam o pobre coitado. Tudo o que lhes restava agora era a guerra.

Siegfried sentiu seu coração pulsar, se de raiva ou excitação, não sabia dizer, então seguiram em frente. Quando chegaram ao Salão dos Poucos e as sentinelas abriram os portões, uma multidão já os esperava lá dentro.

— Capitão!

— O senhor conseguiu!

— Lady Dara, a senhorita está bem!?

— Avisem a condessa!

Nem tiveram tempo de desmontar, as garotas se adiantaram em tirar Dara da sela e levaram ela às pressas para comer alguma coisa e tomar um banho, enquanto os guardas riam e pediam os detalhes da batalha, mas Siegfried não estava em clima de comemorar:

— Cadê a Elly? — perguntou, talvez em um tom de voz mais carregado do que pretendia, já que a animosidade morreu e todos ficaram em silêncio.

Então Elly saiu do salão e veio correndo até ele, enquanto seus homens abriam caminho sem dizer uma palavra.

— C-capitão! O senhor voltou. — Ela sorriu e então começou a procurar ao redor. — A lady Dara… Disseram que–

— As servas a levaram pra se arrumar.

Então desmontou, entregou as rédeas para um soldado qualquer e caminhou com sua sargento para longe dos ouvidos curiosos.

— Meus homens chegaram em segurança?

— Hum? A-ah! Sim, senhor. Eles chegaram essa manhã, mas… D-disseram que o senhor já sabia, mas um deles morreu.

— Walder…

— Segundo me disseram, ele quebrou o pescoço quando caiu do cavalo, senhor.

— E os outros?

— A condessa mandou o Erik embora essa tarde. Disse que não precisava de um soldado cego.

— …

— O-o sacerdote diz que a perna do–

— Os rebeldes. Na entrada da vila. Quando aquilo aconteceu?

— U-um pouco depois do senhor partir. A condessa mandou enforcá-los. Os guardas… Eles estavam bem ansiosos por isso.

— Devia ter protegido o mensageiro!

— S-sinto muito–

— Não quero desculpas! Quero um sargento que consiga manter a ordem na minha ausência!

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