Volume 1

Capítulo 0050: O comando é seu!

Atualizado em: 05 de novembro de 2023 as 16:32

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Como prometido, o conde partiu ao amanhecer.

Apenas ele, com seu andaluz branco, o garanhão negro de batalha e uma mula para carregar seus mantimentos; passaria facilmente um mês inteiro antes que retornasse, mesmo supondo que tudo corresse como planejado. E se Eradan tivesse realmente tomado a Torre da Justiça…

Siegfried observou os soldados esqueletos que esperavam em forma. Exatamente 68. Cada um deles imóvel, silencioso. Uma visão ameaçadora, mas ainda assim…

“Não é muito.”

Flechas de nada adiantariam contra eles, isso era certo, mas não havia hipótese de se realizar um cerco bem-sucedido com menos de cem homens. Mortos-vivos ou não.

Ainda assim, o conde não estava disposto a abrir mão de nem um único guarda.

— A fortaleza é boa — disse —, mas há alguma verdade nas palavras do mensageiro. O condado está infestado de rebeldes. Quarenta homens podem repelir quatrocentos nesses muros, talvez mais. Desde que tenham um bom comandante.

— Protegerei sua casa com a minha vida, vossa graça — assegurou o vice-capitão.

— Disso não tenho dúvidas.

— …

— Se eu não retornar até a primavera, fale com a Cassie. Diga-lhe pra convocar as bandeiras. Me são leais, mas vão precisar de algumas alianças também. Ela sabe o que fazer, mas… Se não vir a razão e tentar enviá-lo embora, encontre Ragnar Kessel. Diga a ele que eu o enviei. Seja sincero, conte como nos conhecemos, responda todas as suas perguntas e, quando terminar, sua espada estará a serviço dele até que Eradan esteja morto. Depois disso, qualquer dívida que tenha comigo, estará quitada, mas eu certamente não desaprovaria se decidisse ficar e servir aos meus filhos. Sam parece ter um apreço muito grande por você.

Quando Siegfried não respondeu, o conde deixou escapar um sorriso que parecia quase triste.

— Bom, apenas pense no assunto. De qualquer modo, não tenho intenção alguma de morrer pra um cavaleiro-rapaz e meia dúzia de camponeses.

Então partiu, com a neve castigando seu caminho e rajadas de vento que tentavam arrancar o seu grosso manto de pele de urso.

Seria uma jornada difícil.

Naquela manhã, todos acordaram cedo para acompanhar a partida do lorde. Servos e guardas interromperam os seus deveres por tempo o bastante para vê-lo desaparecer de vista e, apesar do frio, as janelas do vilarejo se abriram para assistir à marcha.

Quando os grossos portões de madeira se fecharam e nada restou além do silêncio, Siegfried notou que era nele que prestavam atenção.

Guardas e servos. Cada um deles.

Os mais novos tinham mais ou menos a sua idade, e eram poucos. Tinha conquistado algum respeito, mas não era ingênuo; uma coisa era ser o escudeiro do lorde, mantendo seus homens na linha e cumprindo ordens, outra bem diferente era comandar toda a fortaleza.

“Esperam pra ver que tipo de líder eu serei.”

O rapaz se virou para a pequena multidão parada de pé em frente ao salão e gritou para os seus homens:

— Se já estão acordados, peguem suas armas e vão pro pátio de treinamento! Não pensem que a vida aqui ficará mais fácil só porque o conde partiu.

— Sim, senhor! — eles responderam de imediato, quase em uníssono, e então se foram.

As servas também correram e logo o salão estava agitado, como devia. Cada um cuidando das suas funções.

Elly lhe trouxe uma lista de tarefas que teriam de ser fiscalizadas; antes tinha de estar sempre a par do estado das armas e condições dos soldados, agora precisava saber também em que pé andavam as provisões e todos os outros servos.

Enquanto escutava como seria a sua nova rotina, Siegfried viu de longe a condessa, o observando com uma expressão sombria; quando seus olhos se encontraram, ela ficou irritada e partiu.

— … E a gente também precisa… — dizia a garota, quando ele a interrompeu.

— Elly.

— C-capitão?

— Quero dois guardas com a condessa e a Emelia, o tempo inteiro. Queria pôr alguns com o Sam também, mas me parece que ele já tem o bastante.

E observou o garotinho correndo com Mirabel ao lado dos soldados, até o pátio de treinamento.

Mas o vice-capitão não teve tempo de tocar em uma espada o dia inteiro.

De algum modo, passou a manhã inteira indo de um canto ao outro da fortaleza, com Elly ao seu lado lhe dizendo exatamente o que devia fazer. E todos pareciam ter algo do que reclamar; queriam mudar de função, ou ter mais ajudantes, outros queriam menos trabalho, ou só falar mal de alguém de quem não gostavam. Depois de um tempo, parou de prestar atenção.

O mais importante era a comida.

— O conde deixou ordens claras quanto à divisão e racionamento das porções — disse Elly, mas só quando teve certeza de que estavam a sós. — Temos o bastante, mas…

— ‘Mas’…?

— Bem, não seria incomum descobrir alguns guardas e servos tentando surrupiar um pouco das despensas agora que… Bem… Eh…

— Agora que têm um ‘moleque’ no comando, é o que quer dizer, né?

— E-eu não diria dessa forma… Senhor. Mas, é… Seria por isso.

— Então parece que vou ter de prestar atenção extra aos mantimentos. Pois bem! Crie um novo posto de guarda. Três homens em três turnos deve ser o bastante. Mande-os fazer uma lista de tudo ao começo de cada turno, e checarei todas pela manhã. Se tiver algo faltando, encontramos os responsáveis, se não, os responsabilizo. Ah! E escolha homens que pensem com a cabeça, não com o estômago.

— Sim, senhor.

O resto foi fácil.

Deu algumas broncas nos guardas por ficarem incomodando as servas durante suas funções e ordenou que alguns reparos fossem feitos aqui e ali, principalmente nos muros.

Não importava. A Elly dizia o que estava errado e Siegfried como cuidariam do assunto.

Quando chegou o almoço, parecia que um ano inteiro tinha se passado. Estava exausto e foi o último a comer, mas a cozinheira guardou uma porção ainda quente de carne seca com batatas para ele, junto de uma grande caneca de cerveja.

O rapaz se sentou em uma mesa vazia e devorou metade do prato em um instante, até quase engasgar, então bebeu a cerveja para descer tudo.

— Dia cheio? — perguntou Gwen, que apareceu ao seu lado sem fazer barulho.

— ‘Cheio’. — Sorriu, mais de irritação do que qualquer outra coisa. — Parece que ninguém sabe fazer nada sozinho por aqui. Acho que nem lembrariam de pôr as calças se alguém não mandasse. É um milagre que esse lugar ainda esteja de pé. Quero dizer, é sério que a droga do moleque dos barris precisa que alguém lhe diga pra tampar a merda dos furos!? Passei o dia andando em círculos e falando o óbvio.

— É, eu vi. — Ela o encarou por um momento e então sussurrou: — O homem mais poderoso da fortaleza…

— O quê?

— Você. Quando o conde tava aqui, cê era o só o segundo. Agora cê é o primeiro… Cê ainda é leal a ele?

O rapaz não precisou responder, bastou apenas um olhar para ela deixar escapar um suspiro e continuar.

— Foi o que eu pensei. Eu não entendo vocês, garotos. Por que cês são tão obcecados por essa coisa de ‘honra’? Ela não serve pra nada!

— Eu tenho uma dívida com o conde!

— Por ele não cortar a sua cabeça? Então cê tem uma dívida comigo também, não abri a sua garganta quando nos conhecemos e te soltei daquela vez, lembra? Já dá duas.

— Foi diferente.

— Por quê?

— Da primeira vez, porque eu também não abri o seu crânio com a minha espada, e da segunda eu só fui preso porque salvei a sua vida.

— Não lembro de ter pedido ajuda.

— Ainda assim.

— Humpf. Pra mim, parece mais que cê tá de desculpinha. É pra isso que cê virou mercenário? Pra cair nas graças de um lorde qualquer e virar o cachorrinho de estimação dele?

— Claro que não!

Ela se irritou:

— Então por quê!? Que merda cê tá fazendo aqui!? E nem vem com essa merda de ‘honra’ e ‘lealdade’, porque essas palavras não querem dizer merda nenhuma pra mim!

— Isso não é da sua conta!

— Então eu vou embora! — Ela se levantou e o rapaz sentiu seu sangue gelar.

— Por que você tá agindo assim!?

Ela abriu a boca e, por um momento, pareceu que diria algo, mas ao invés disso mordeu os lábios e foi embora antes que ele pudesse detê-la.

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