Volume 3

Capítulo 112: Sombras do passado

Atualizado em: 20 de março de 2024 as 00:19

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— Você demorou — comentou Hikari, observando a figura de Silver se aproximando.

A luz do sol destacou os olhos azuis gelo da kunoichi, os quais brilharam dando um toque a mais de beleza a ela. Seus cabelos pretos amarrados em um coque e roupas também pretas criaram um contraste interessante à sua feição.

— Bem, tive que buscar Freud pelo caminho e ele estava acabado depois de apanhar muito então… — Dando de ombros, o dragão prateado imediatamente jogou a culpa no jovem ao seu lado.

— Quê?! Eu não apanhei… — Lembrando da dor que os golpes do gigante trouxeram, ele complementou — Muito.

— Viu? Ele apanhou tanto que começou a alucinar, coitadinho. — Utilizando um tom melancólico, Silver apoiou sua mão no ombro do raiju.

Hikari rolou os olhos com um leve sorriso enquanto Freud tirava a palma de seu ombro. Após esse momento de brincadeira, eles se voltaram para a quarta pessoa no local, a qual tinha uma expressão plana, embora seus olhos expressassem uma leve curiosidade.

— Já faz algum tempo, Iris.

— Sim…

— Da última vez você meio que me deixou de cama. — Um leve suspiro escapou de seus lábios pela falta de reação da garota, mas ele seguiu mesmo assim — Então, você vem conosco?

As duas garotas trocaram olhares por um momento antes da jovem acenar em confirmação. Decidindo não perseguir o assunto, Silver começou a caminhar acompanhado pelo trio.

— O que aconteceu com o oponente de vocês? — O grupo manteve o silêncio enquanto caminhavam pela floresta escura, no entanto, Freud não conseguiu manter isso por muito tempo.

Seu oponente foi incinerado por Silver então não haviam provas de sua luta, mas Hikari não tinha habilidades relacionadas ao fogo e ele acreditava que Iris era o mesmo. Por isso a falta de corpos ou sangue no local onde eles se encontraram foi estranho.

— 00100 fugiu… — O tom de Iris era bem plano, então o jovem não pôde distinguir se ela estava decepcionada com a situação.

— Meus ‘parentes’ estão vivos, se é o que quer saber. De fato, eles devem estar correndo agora mesmo para reportar ao clã. — Havia um tom de sarcasmo na voz de Hikari quando mencionou sua família.

Imaginando ter tocado em um assunto sensível para ela, Freud pretendia se manter quieto, mas sua curiosidade superou sua ‘delicadeza’. O trio percebeu a situação, porém eles permaneceram calados.

— Então, o cara que viemos matar faz parte da família de Hikari? — Era uma dúvida que acabara de surgir em sua mente após a resposta da kunoichi.

‘Eu sei que toda família tem seus problemas, mas isso não é um pouco excessivo?’

Foi uma questão válida, no entanto, ela era real apenas se tratando de uma família comum. No geral, para a maioria dos clãs nobres este tipo de disputa era comum, ainda mais durante as disputas para a sucessão do ‘trono’.

— Detalhes. Freud, detalhes — respondeu Silver, sem se virar.

— Ele é adotado. — A kunoichi também não parou, apenas oferecendo um simples comentário.

‘Dentro dessa família só tem duas pessoas com quem eu me importo’

O inimigo ser adotado era uma verdade inegável, no entanto, não teve peso algum na decisão de matá-lo. Relevando completamente este detalhe, a jovem não teve objeção alguma em matar um de seus consanguíneos porque seu alvo ameaçou uma pessoa importante para ela.

O raiju alternou seu olhar entre a dupla, incerto de como reagir a esse detalhe.

— Ok… Então, que tipo de inimigo eu devo esperar? — Eventualmente ele deixou o assunto de lado, fazendo outra pergunta e rezando para que eles respondessem profissionalmente por ter usado a palavra ‘inimigo’ ao invés de ‘pessoa’.

— Hmm… Eles funcionam como uma meritocracia, então você pode esperar ser perseguido por um bando de ninjas com paralisia facial competindo para ver quem vai te matar primeiro. — Pausando por um momento, ele continuou — Sem ofensa Hikari.

Rolando os olhos, a jovem virou o rosto como se houvesse sido afetada por isso, mas seus lábios se curvaram em um leve sorriso.

— Oh, só uma coisa. O mais capaz deles ganha o título de Yoru e, como dita a tradição, ele abandona toda sua vida antes disso para se dedicar apenas ao clã. — A mente flutuou ao se recordar da última vez que se encontrou com o atual ‘Yoru’.

— Que tradição estúpida. — Freud não conseguia entender a razão de alguém abandonar tudo apenas por um mero título.

— Deprimente… — Iris tinha os mesmos pensamentos sobre isso.

Para ela, que não tinha ninguém para chamar de família e tampouco de amigos, esse conceito de abandonar tudo que tinha em prol de ‘anunciar’ sua força.

— Ah! Sem ofensa Hikari. — Lembrando que uma das pessoas ao seu lado era parte dessa família, o raiju se apressou em se desculpar.

Graças a pressa, o jovem inconscientemente usou as mesmas palavras que Silver, trazendo um sorriso ao rosto do dragão prateado e fazendo o mesmo receber um olhar de ‘isso é culpa sua’ da kunoichi.

— Só evite espalhar suas ideias quando estivermos no território deles. O atual Yoru está velho, mas não é fraco de forma alguma. — O tom de voz de Silver era sério, e suas sobrancelhas tremeram quase imperceptivelmente.

Escutando isso, um olhar incrédulo surgiu na face de Freud e o garoto piscou múltiplas enquanto procurava algum sinal de sarcasmo e desdém no rosto de Silver.

— Que cara estúpida é essa? Posso até ser arrogante, mas eu reconheço alguém forte quando vejo.

— Não duvido nem um pouco disso, mas… — As palavras do raiju se arrastaram por alguns momentos, procurando as palavras certas — Só nunca escutei você falar isso de mais ninguém.

— Porque vocês são fracos. — A frase feriu Freud mais do que qualquer golpe, mas ele não pôde refutar.

‘Já perdi para ele antes, então eu realmente devo ser “fraco” nos termos dele’

Sem mais trocar palavras, o grupo seguiu caminhando e, não muito tempo depois, chegaram em seu destino.

Saindo de uma área escura, seus olhos lutaram para se ajustar ao súbito influxo de luz. Após se acostumarem, a visão do grupo foi agraciada com a vista de um vilarejo, o qual seguia o exemplo do que os livros chamariam de antiga civilização japonesa.

As folhagens densas das árvores cobriam o céu do local, assim como na trilha que os levou até aqui. Porém, além dos breves feixes de luz que atravessavam o dossel, lanternas de papel iluminavam o lugar, criando padrões de sombra nas paredes das casas.

As casas tinham telhados inclinados de madeira escura e paredes de papel translúcido, os quais tinham suas estampas destacadas pelo brilho das lanternas e reforçando os padrões cativantes presentes em cada parede.

Pedras polidas pavimentaram o chão da vila, serpenteando entre as casas e circulando ao redor de uma árvore de cerejeira que trouxe uma cor para o vilarejo banhado em sombras. O vão entre as pedras e a árvore foram preenchidas por um riacho sereno, com uma pequena ponte ligando a ‘ilha’ na qual a árvore se encontrava.

Antes do grupo se aprofundar na observação, dezenas de figuras surgiram na frente deles sem produzir som algum.

O líder do grupo aparentava estar na meia idade, com fios brancos adornando algumas partes de seus cabelos pretos. Sua face estava ‘vazia’, sem uma fagulha de cicatrizes ou marcas de expressão e seu rosto não apresentava nenhuma emoção.

Aqueles que seguiam o homem refletiram essa expressão apática, porém, os comparando ao seu líder era como comparar um lago e um mar. Os seguidores dele obviamente forçaram esta falta de sentimentos, enquanto nele parecia ser perfeitamente natural.

O grupo recém-chegado tinha uma feição pálida, o que era compreensível dada a baixa quantidade de luz no vilarejo. Suas vestimentas tinham como cor predominante o preto, destacando a palidez em sua pele.

— Eles reportaram rapidinho, né? — comentou Silver, se referindo aos familiares que Hikari dispensou mais cedo.

Olhando ao redor, o jovem percebeu que fora ele, ninguém no seu grupo compartilhou de sua tranquilidade.

Hikari tinha um olhar levemente melancólico na direção dos recém-chegados, e sua expressão congelou um pouco quando seus olhos se encontraram com os do líder deles. Freud estava tenso e com os punhos cerrados como se esperasse um combate.

Já para Iris, ele não sabia decifrar o rosto inexpressivo dela, mas a jovem também tencionou seus membros, aguardando qualquer sinal de um possível combate.

‘Ah, certo. Eles não conhecem os costumes deles’

A kunoichi dispensou seus familiares anteriormente porque, embora houvessem atacado o grupo, eles não poderiam derramar sangue hoje.

‘Eu deveria contar para ele?’

Observando a feição preocupada de Freud, o jovem ponderou momentaneamente se deveria revelar que não havia perigo algum nesta situação.

‘Nah, ele se vira’

— A quanto tempo! Será que eu estou vendo alguns fios brancos novos na sua cabeça? — Com um sorriso no rosto, Silver observou as expressões do grupo se distorcendo em raiva pelo comentário.

— Já faz algum tempo, Hikari. Vejo que você trouxe convidados indesejados, outra vez. — O homem não poupou um olhar para Silver, olhando fixamente para Hikari.

— Sim, já fazem alguns anos, Yoru. — respondeu a jovem, optando por se manter em silêncio sobre o comentário dos convidados.

‘Imaginei ele de máscara’

Com base no conceito de ‘abandonar’ a própria identidade, Freud imaginou alguém vestindo uma máscara plana, sem nenhum desenho ou adorno para se separar da sua identidade ao ‘apagar’ qualquer característica dele, e talvez vestindo roupas largas para que o gênero também não importasse.

— Você já sabe como as coisas funcionam por aqui — disse o homem, fazendo um gesto de mão que resultou na saída de todos seus seguidores.

Após a saída do grupo, o clima permaneceu tenso entre o quarteto e Yoru. O homem estava em silêncio, olhando com neutralidade para Hikari e ignorando os outros três. A kunoichi espelhou o olhar enquanto Silver rolou os olhos.

‘É assim que uma família comum age?’

Iris por sua vez, piscou em curiosidade. Ela havia lido livros sobre dinâmicas de família e foi bastante interessante observar de perto uma destas situações.

O raiju suspirou em alívio pelo desaparecimento dos seguidores de Yoru. Ele havia visto algumas crianças dentre eles, o fazendo hesitar ao pensar em feri-los.

— A disputa de olhares está divertida e tudo, mas vamos ao que importa. — Se aproximando do homem com passadas calmas, Silver entrou no campo de visão dele enquanto dizia.

Pela primeira vez desde que apareceu, Yoru olhou para alguém que não era Hikari, embora não por livre e espontânea vontade.

A grama se quebrou sob os pés do jovem quando ele deu um último passo, ficando cara a cara com o homem. Uma leve brisa atravessou o local, e o farfalhar das árvores quebrou o silêncio na área.

— Modos impecáveis. Sei que vocês vieram por Mutsuri mas, até o fim de hoje, sangue não será derramado. — Embora iniciasse com um comentário sarcástico, seu tom de voz continuou neutro.

Esta era basicamente a mesma situação que aconteceu quando Seiji, Mari e Moon entraram em seu território durante o descanso entre os torneios. Mas, desta vez, Silver estava fazendo uma demanda fora do limite.

— Nos vemos no jantar. — Após um momento de silêncio, Yoru deixou suas últimas palavras antes de se virar e caminhar vila adentro.

Sentimentos conflitantes tomaram Hikari ao assistir as costas do homem desaparecendo. Iris e Freud se sentiram como espectadores nesta situação, sendo os únicos presentes no local que não tinham uma história com o grupo.

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